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Petrópolis,30/04/2025

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Vidas periféricas: ficção narra jornada de jovem na favela

Em "Uma Negra Comédia", Fábio Gonçalves narra a história de um jovem que nasce, cresce e amadurece na periferia à medida que traça um retrato multifacetado do Brasil


Vidas periféricas: ficção narra jornada de jovem na favela Foto: Divulgação / Edivânia Moreira
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O protagonista-narrador de Uma Negra Comédia permanece sem nome do início ao fim. Talvez em razão de ser uma história parecida com a de muitos brasileiros, mas também porque a própria narrativa em primeira pessoa já torna sua vida tão única que dispensa uma identidade definida. Neste novo livro de Fábio Gonçalves, o personagem principal é um garoto que cresce e tenta se compreender no mundo diante de uma realidade violenta na periferia de São Paulo.

Nascido nos anos 1990, mora no Jardim Luso, favela que faz divisa com Diadema, à época considerada a cidade mais perigosa do Brasil. Filho de uma família de quatro irmãos de diferentes pais, muitas vezes assume o papel de cuidador da casa enquanto a mãe trabalha como empregada doméstica em uma região nobre da capital e lida com as agressões do padrasto, o proprietário do cortiço onde todos residem.

Neste contexto, o garoto relata experiências íntimas sobre amor, amadurecimento e perspectivas de futuro ao passo que é constantemente impactado por questões externas. Enquanto experimenta felicidades e frustrações do primeiro romance na infância, descobre as consequências fatais do crime, entende a influência do tráfico na comunidade, encara a falta de oportunidades para os jovens periféricos, percebe os impactos da violência doméstica e compreende as nuances das desigualdades socioeconômicas.


Manhã de chuva, tempo feio, São Paulo coberta por uma grossa manta enfarruscada. Minha rua, feita de barro e pedregulhos, desmanchava-se num lamaçal escorregadio que desencorajava os moradores dos barracões e cortiços. Só saíam os trabalhadores, pulando poças, equilibrando sombrinhas, agarrando-se em portões alheios, sendo mal-recebidos pelos cães, que eram tantos e tão sem-cerimônia. Daí chegavam ao ponto final do Jardim Luso e entravam com os pés barrentos e as jaquetas molhadas e as sombrinhas gotejantes no ônibus que os levaria ao Interlagos, ao Brooklin, ao Morumbi. Estava lá a minha mãe. (Uma Negra Comédia, p. 23)

Em Uma Negra Comédia, os leitores adentram o universo íntimo do narrador, mas também se conectam com os personagens ao seu redor. Nandinho é o irmão mais velho, um homem carismático, pagodeiro e mulherengo que tenta o sucesso fora da favela; Sofia é uma pessoa com deficiência e precisa de cuidados, mas é negligenciada pela mãe que lida com a falta de tempo e a saúde fragilizada; Luana é a caçula, que se torna independente rápido demais; Dona Marta é a matriarca, que saiu da roça de Minas Gerais para trabalhar na metrópole; e Mestre Caruso é um professor de karatê que tenta transformar a vida dos jovens pelo esporte.

Com capítulos curtos e uma narrativa fragmentada, o autor une o lirismo à coloquialidade para reforçar a autenticidade literária das expressões cotidianas da periferia de São Paulo. Entre doses de humor, tragédia e ironia, expõe problemas profundos da sociedade brasileira sob o olhar de um menino que se entende como sujeito ao longo do enredo e carrega em si uma introspecção hamletiana frente a cenas assustadoras.

Criado em Diadema, Fábio Gonçalves explica: “escrevi este livro para registrar realidades que pude observar, de perto, na minha infância, adolescência e início da vida adulta. É uma tentativa de pintar, com olhar autônomo e sincero, sem o auxílio das lentes dessa ou daquela ideologia, um quadro da minha realidade que, sob vários aspectos, é paradigmática e representativa de problemas crônicos do nosso país”.


 

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